- És uma mulher “na mouche”! – disse-lhe ele com um sorriso entre o maroto, desafiador e sincero.
- Sou uma mulher na quem?! – perguntou-lhe ela surpreendida pela descontinuidade repentina da conversa que, de mãos dadas, resvalava para o sexo e começava a aquecer.
- Eu disse que és uma mulher “na mouche”. Aquela mulher que é a mulher certa, autêntica. Uma mulher com M grande, cheia de grandes qualidades e maiores defeitos. A mulher completa que procurei incessantemente e acabei de agora mesmo, em ti, encontrar.
Ela contemplava-o desconcertada, sem saber o que lhe dizer. O seu olhar falava a sério, mas a expressão “na mouche” tinha algo de trocista que sempre lhe desagradara. Soltou a mão que tinha na dele e encarou-o de frente.
- Não te entendo. O que queres dizer com isso? De onde apareceu? Vindo do nada? Conheces-me tão pouco, há tão pouco tempo…
- Enganas-te. Conheço-te inesperadamente bem. Talvez estranhamente melhor que a mim próprio. Tu dás-te. Dás-te toda. Enquanto estávamos aqui a descambar a conversa para o sexo, toda tu te davas. As mãos, o peito, a boca, o ventre, as pernas… toda. Tu dás-te. Entregas-te. Ofereces o teu espírito sem dares por ela. E isso é único. Raro. Apetecível.
- Dou nada! Era só o que me faltava. Dar-me a quem quer que seja! Não me dou, ninguém me tem, nunca o meu corpo ou coração irão pertencer a ninguém. Não! Não me dou.
Afastou-se um pouco do seu corpo másculo. Ali naquele banco de jardim na cidade, entre outros casais que passeavam, entre velhotes que jogavam cartas em pequenas mesas à sombra das árvores, entre crianças que jogavam à bola e donas de casa que passeavam o seu cão. Fugiu-lhe meio metro para pensar.
“Na mouche”! Ela não se sentia ser assim, mas aquelas palavras acertaram-lhe dessa forma. Com pontaria. No alvo. Nunca nenhum homem lhe dissera que ela era completa. Ela sabia que o homem que assim a descobrisse a teria como sua para sempre. Assustou-se. Tinha-lhe dito que não se dava mas, ali, emocionalmente despida, tinha acabado de se oferecer de bandeja àquele homem quase desconhecido que a queria igual a si mesma.
Voltou para o seu lado, voltou a dar-lhe a mão.
- Se calhar tens razão. Se calhar sou o que descreveste. “Na mouche”. E isso deve ser porque o despertas em mim. Deve ser porque o sou para ti.
Ele puxou-a para si e deu-lhe o primeiro de muitos beijos. O melhor beijo de sempre. Para os dois. Lábios colados “na mouche”, almas juntas que naquele jardim se aproximaram e uniram para sempre.
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