Sunday, September 2, 2012

Conto: Desabafo de uma atriz porno


Alguém já te tocou de tal forma que o seu corpo todo estremeceu, o tempo estacionou em câmera lenta e você se imaginou dentro de uma cena de filme? Não em uma cena romântica, mas em uma cena bem erótica, daquelas proibidas em horário nobre, onde mãos maliciosas, boca saliva aparecem em close, e no som apenas a respiração forte de um casal de belos corpos que te atiça ainda mais o fogo, e você, de tão envolvida, aperta o travesseiro entre as pernas, molha os lábios com a língua e deseja um dia viver um momento tão intenso?



Pois foi assim quando ele me beijou. Foi desejo, foi excitação, foi tesão, foi tensão, e tudo tão, que por tamanha intensidade pareceu irreal. Talvez porque há tempos existia um desconforto entre nós dois. Talvez porque nós dois era algo, se não proibido, bastante insensato. Talvez porque ocorreu em um momento inesperado, não menos desejado, sempre desejado. Não nego que sempre o desejei.
Mas ele era o homem que me mandava beijar outro homem, que dirigia minhas mãos, minha boca, meus beijos. O homem que me fazia tirar a roupa na frente de outros homens. E que nunca me tocava. Nunca. E que me tratava como se eu fosse um banquete, uma boneca sem vida, oferecida para outro se deliciar, brincar. E ele quem comandava a brincadeira, o jogo, a cena. “Pega com mais força, com mais virilidade, com mais suavidade. Pega a bunda, os seios. Morde o pescoço. Close no dorso nu. Corta!”

Nunca me atraí por nenhum dos ator com o qual contracenei. É estranho interpretar para um artefato cheio de luzes e câmeras, com um diretor gritando ação e definindo o ângulo da sua cabeça e a abertura da sua boca. É ainda mais estranho se relacionar com um homem em meio a esse artefato, um homem sem texto próprio, dirigido. Não gosto de atores e da liberdade de seus corpos. Não sabia até então que gostava dos diretores e de sua voz de comando.
Ele era um jovem bastante talentoso. Dirigia o primeiro longa-metragem aos trinta e dois anos, sendo que o roteiro, que trazia sua assinatura, tinha mais de dez. Namorava a executiva da produção, companheira antiga da época de faculdade e de muitos curtas. Uma mulher atraente e descolada, que tinha a incrível capacidade de resolver problemas. Ela sabia quem era a verdadeira paixão de seu homem. Sabia que não era ela, e, sim, a estética, ação, o cinema. E ela, que de burra não tinha nada, fazia de tudo para ser parte dessa paixão.

Se eu o desejava, era sem malícia. Admirava o seu compromisso com a materialidade da criação. Ele era um criador de estórias, de personagens, de vidas. E eu entendia a minha importância ali. Aliás, a importância da câmera era muito superior a minha. Os artefatos que compunham aquele cenário de ação valiam muito mais do que eu. Eu reconhecia, na minha humildade reprimida, que é muito mais fácil conseguir uma atriz, ou uma mulher, por mais bela e talentosa que fosse, do que viabilizar o primeiro filme de longa-metragem. Eu me sentia tão insignificante que jamais esperei que algo entre nós pudesse rolar. Talvez por isso o nosso primeiro beijo tenha sido um gozo.
Pode parecer bobagem, mas arisco a dizer que o beijo começou antes do contato entre os lábios. Durante a gravação de uma cena, onde a minha personagem fazia amor, o diretor, impaciente com a atuação morna do meu companheiro, adentrou na frente das câmeras e decidiu ensinar como se faz. Sua boca não me tocou, mas todo o resto do seu corpo sim. E o toque, daquele que nunca havia encostado qualquer parte da pele em mim, foi fatal. Para os dois.


O filme contava a história de uma mulher destemida, que não conhecia o medo, a vergonha ou o significado da palavra pudor. Mãe, mulher, amante de muitos homens, a minha personagem batalhou pelo direito de amar quem quisesse. Batalhava ainda, diariamente, para ter mais do que o que comer, queria uma vida de luxos e riquezas pra si e os filhos, e não reconhecia limites para conquistar isso. Irene não se acovardou ao assumir a chefia do tráfico na Rocinha e reinou soberana, com tanta violência e covardia, que nada deveu a seus antecessores. Todos os homens do morro sonhavam uma noite na cama da rainha da favela. E obedeciam-na cegos e tontos por sua beleza e poder.
Por causa do toque nervoso do meu diretor, descobri o poder que eu, ou a minha personagem, exerciam sobre aquele homem. Não tardou a brotar em mim uma vontade louca de experimentar esse poder. Queria eu dirigir a brincadeira, o jogo, a cena. Queria eu tirar a roupa fora de ordem, e ordenar que ele me tocasse, com mais força, com mais virilidade, com mais suavidade. Que mordesse minha bunda, meus seios, meu pescoço. Que beijasse minha boca cheio de excitação. Ação. Sem cortes!
Nunca verbalizei nada, mas desconfio que meus olhos treinados para a objetiva transmitiam muito das minhas reais intenções ao jovem diretor. Porque ele passou a me evitar de forma até irresponsável. Praticamente não me encarava, fugia de todo e qualquer diálogo, resistia pudico à gravação de cenas mais ousadas, desconstruindo seu próprio roteiro. Estava claro que o diretor não admitia mais que outros homens me tocassem. Queria ele se transformar em ator, fazer todas as cenas comigo e muito mais. Apesar do desejo de ambos, as coisas ficaram em suspenso por um longo tempo. Nada ocorreu.


Se o diretor tinha sua executiva. A atriz também tinha o seu. Marcos. Um cara super gente boa, bem sucedido, bonito, que se beneficiou, e muito, da minha atração pelo diretor. Meu corpo era sexo. E Marcos nem tentou descobrir o motivo desse tesão todo, pelo contrário, gostava bastante da coisa e não se fazia de rogado. Transávamos como loucos, insanos. Adorava chupar o pau do Marcos, embora permanecesse curiosa do gosto, desejosa do sabor do pau do diretor. Chupava o Marcos a qualquer hora e lugar, sem pressa, porque eu precisava saciar a fome de um homem que eu não podia ter.
Rolavam fofocas nos bastidores de que o diretor e a namorada viviam se comendo nas locações. Parecia um fetiche qualquer que envolvia transar entre cabos, refletores apagados, câmeras e tripés. Em certa oportunidade, eu cheguei a flagrar o casal numa situação um tanto quanto suspeita. A gravação estava sendo realizada em uma igreja. E foi na igreja, atrás do altar, que eu vi o diretor levantando as calças e a executiva abaixando a saia.
Nesse mesmo dia, Marcos fez surpresa e me buscou na gravação. Eu estava super excitada com a ousadia do diretor, morrendo de ciúmes e inveja de sua namorada. E, por uma necessidade quase que infantil de dar o troco, caí de boca no membro gostoso do meu namorado antes mesmo de sair do estacionamento do estúdio. Marcos estava adorando, claro! Só que levou um baita susto ao passar por uma blitz policial e quase ser abordado. Por sorte, os policiais entenderam a tempo a situação e, para evitar constrangimentos, não se aproximaram o suficiente para me ver com a boca no trombone. Imagina ser presa por atentado ao pudor e ter que prestar depoimento com a boca cheia de porra?

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