Saturday, November 3, 2007

Invicto prazer...


Olho para o horizonte e vejo: ali, à minha frente, aos olhos do mundo, um sol que se deita, numa cama de água. Um sol que lentamente se transforma em cores quentes de paixão ao tocar na água do mar, sua amante. Ela recebe-o, deixa-se penetrar por aquele calor ameno, ruboriza-se em ondas de desejo e, suavemente, toma-o para si, por completo, deixando a noite se tornar na sua cama.

E que noite... que noite!

Aos meus pés corre um rio, que apressado se dirige para o mar. Uma água doce que corre para temperar o salgado quente que vejo no horizonte. Uma ménage à trois de confluências, de forças, de temperaturas, que se antevê. Um misturar de sucos, fluxos... um lubrificar de vontades. Um preparar de uma sagrada celebração...

E como queria juntar-me nessa celebração... como queria!

Vejo do outro lado do rio a minha cidade, testemunho de tanto que já senti e vivi nestas duas margens. Invicta concubina que, noite após noite, assiste à luxúria destas forças da natureza e que, sempre que lho permitem, nela participa. Não se permite ficar à margem destas vivências e deixa emergir o que de melhor tem. Veste as suas melhores roupas, ilumina-se, produz-se, destaca-se... despe-se de pudores e a este espectáculo amoral, quase boémio, se junta. A sua luz, a sua energia, é neste quadro a pincelada vital...

E que luz... como esta me ilumina!

À luz da cidade junta-se a tímida luz da lua, que sobe nesta tela, à medida que o sol na água do mar se afunda. Cobre-nos de purpurinas prateadas, num abençoar deste festim carnal. Eleva-se para o primeiro acto de uma peça que já vai a meio, na qual irrompe como brilhante actriz principal... perde a timidês e precipita-se para cena. O espectáculo ganha outro vigor, outra força, outra dinâmica... os seus actores interagem numa cadência cada vez mais intensa, louca, desgovernada! O climax aproxima-se, não me seguro e entro em palco! Projecto a minha voz neste promíscuo desempenho de papeis. Desejo aquele momento único, orgásmico...

E como desejo... como quero!

Impelida pelo forte querer, agitada pelas convulsões de uma alma excitada, inquieta com um corpo húmido que desliza por entre esta imensidão de sensações, deixo-me ir. Aquecida pelos raios laranja do sol, mergulho nesta água salgada, deixo-me penetrar também. Outra doce água serpenteia no meu corpo, transforma-me em ondas de prazer. Sinto-me iluminada pela luxúria desta cidade que me viu nascer, que entrega a sua filha numa orgia emocional. Sinto a minha alma a se expor, sinto o meu corpo a se descontrolar e, no momento em que a brilhante luz da lua me invade, me toca a pele, expludo num mar de vibrações, em mim corre um rio de prazer...

A plateia levanta-se em ovação, aplaude este espectáculo singular...

Eu agradeço, uma lágrima rola na minha face... toca os meus lábios exaustos, ainda entreabertos e sorvo-a já com saudade.

Invadida pelo calor de um sol que só em nós brilha, deixo que este se ponha e permito-me descansar. As cortinas fecham-se... Eu fecho os olhos, abraço a lua e envolta em lençois rendilhados de estrelas adormeço por fim...

Até amanhã.

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